mardi, janvier 20, 2004
Assim me sinto, aqui sentado...
Sinto uma certa vontade de não viver, mas sem vontade de me matar. Tenho medo, de ter medo, e de ser sobressaltado pelo medo que tenho de ter medo. Falta-me, qualquer coisa me falta. Ou não me falta nada. Sinto apenas uma profunda tristeza interior.
Hoje estou assim, parado, calado. Ontem saltava, eufórico – nem me lembro de quê. Há dias e dias. Há coisas intemporais e outras temporais. Hoje estou sem temperamento para a paciência, para o pensamento. Talvez mais tarde, agora não.
Mas tudo pode melhorar, tudo pode mudar. Se começar hoje, terei a certeza que amanhã será melhor. Mas é preciso começar. Mas hoje não. Por amor de Deus, hoje não que me dói o corpo e a alma. Sofro. Como se sofre com uma tempestade: nada podemos fazer.
Tenho medo. Medo e revolta. O medo gera a revolta e a revolta assusta-me. Estou com medos de nada e medos de tudo.
Estou a fugir. Tento-me prender à terra – o corpo, o corpo -, e fujo para longe, para lugares antigos e futuros, que são os meus, longe do circo experimental das aparências.
Aprisionado no meio daquilo que não quero, dissolvo-me numa espécie de ser humano que vive a vida que não imaginou. Assim, só isto. Eu sei. É difícil, impossível, visualizar esta sequência.
De voz baixa, escrevendo com a mão direita, fumando com a esquerda, e com a loucura intratável espelhada nos olhos, pareço um milagre de contenção e de desespero iminente. Assim não há Deus que me valha. Deixem-me um pouco em paz. Se alguém fez mal a deus, não fui eu, nem sequer lá estava. Deus, nunca vi nada igual. Mas sei, percebo, que esse é o teu papel: introduzir coisas inimagináveis na minha vida. E nem assim sinto o perigo real de enlouquecer – quem me dera; que esta vida mais me parece a porta de entrada para o Inferno. Talvez o melhor seja não me preocupar. Talvez seja apenas uma questão de tempo.
Posso fugir disto, daquilo, de tudo, ou posso confrontar a situação, controlá-la. Mas nunca ninguém ouviu dizer que a persistência pode ser uma enorme estupidez?
Ando baralhado. E o pior é que o meu psiquiatra é desconfiado: mais uma semana e interna-me!
Carlos Caldeira
Hoje estou assim, parado, calado. Ontem saltava, eufórico – nem me lembro de quê. Há dias e dias. Há coisas intemporais e outras temporais. Hoje estou sem temperamento para a paciência, para o pensamento. Talvez mais tarde, agora não.
Mas tudo pode melhorar, tudo pode mudar. Se começar hoje, terei a certeza que amanhã será melhor. Mas é preciso começar. Mas hoje não. Por amor de Deus, hoje não que me dói o corpo e a alma. Sofro. Como se sofre com uma tempestade: nada podemos fazer.
Tenho medo. Medo e revolta. O medo gera a revolta e a revolta assusta-me. Estou com medos de nada e medos de tudo.
Estou a fugir. Tento-me prender à terra – o corpo, o corpo -, e fujo para longe, para lugares antigos e futuros, que são os meus, longe do circo experimental das aparências.
Aprisionado no meio daquilo que não quero, dissolvo-me numa espécie de ser humano que vive a vida que não imaginou. Assim, só isto. Eu sei. É difícil, impossível, visualizar esta sequência.
De voz baixa, escrevendo com a mão direita, fumando com a esquerda, e com a loucura intratável espelhada nos olhos, pareço um milagre de contenção e de desespero iminente. Assim não há Deus que me valha. Deixem-me um pouco em paz. Se alguém fez mal a deus, não fui eu, nem sequer lá estava. Deus, nunca vi nada igual. Mas sei, percebo, que esse é o teu papel: introduzir coisas inimagináveis na minha vida. E nem assim sinto o perigo real de enlouquecer – quem me dera; que esta vida mais me parece a porta de entrada para o Inferno. Talvez o melhor seja não me preocupar. Talvez seja apenas uma questão de tempo.
Posso fugir disto, daquilo, de tudo, ou posso confrontar a situação, controlá-la. Mas nunca ninguém ouviu dizer que a persistência pode ser uma enorme estupidez?
Ando baralhado. E o pior é que o meu psiquiatra é desconfiado: mais uma semana e interna-me!
Carlos Caldeira