mercredi, novembre 19, 2003
A Sandra está imparável
O enigma de um botão!
Estou cansada!
Estou farta!
Parece que o mundo resolveu perseguir-me, palpitar sobre, não me entender. A paciência chegou ao fim, ou será que anda aqui algum astro mau?!
Eh pá! Quem manda neste mundo pode esquecer um pouco de mim?!
Ninguém me ouviu! Andavam todos numa ânsia por desligar-me. Andavam todos com as frases da sabedoria: «Tens que aguentar!». Toda a gente sabe que tem que aguentar, e mesmo que não saiba vai descobrir sozinho, não precisava de ouvir esta!
«O mundo agora é assim!». Gostei da compreensão. E a solução!
Então um dia decidi. Parece que a única burra estúpida sou eu! Afinal todos têm uma teoria para resolver os meus problemas, e principalmente a língua afiada: «era escusado... podia ter feito... o melhor é não pensar muito... pensas demais.... dás demasiada importância a ... esquece isso... não vale a pena...»; bem soluções que todos estamos fartos de ouvir, e quando calha a nossa vez, ficamos verdes, ou azuis, talvez encarnados, de raiva por ter que engolir aquele sapo intragável, que na mão é escorregadio, na garganta áspero, embrulha o estômago de tal forma que ficamos às riscas e depois a digestão dá insónias!
Que pastilha esta!
Então resolvi procurar aquilo que todos tinham mas que eu não conseguia encontrar: o botão de desligar!
O melhor é ir a pé! Chama-se a isto prospecção de mercado. Vá, toca a andar. Nariz para cima, costas direitas e lá vais tu...
Deduzi: se é para desligar, então o que tenho que fazer é procurar uma loja de electrónica ou será de computadores?! Logo se vê, afinal tens tempo!
Entrei numa e o funcionário ficou a pensar que tinha avariado de vez. Esta precisa de Prozac!
- Não temos. - diz ele com o seu ar muito simpático, mas olhar de Coitadinha! - Não era melhor procurar um médico!
- Não eles não entendem! Para este problema ainda não foi encontrado o medicamento certo! – disse eu com o meu ar desiludido e frustrado.
Entrei noutra loja, e passei à seguinte e nada! Percorri todas.
Desisti!
Resolvi perguntar aos sábios como faziam essa coisa de desligar, porque já tinha percorrido todas as lojas de electrónica de Lisboa e ninguém tinha o tal botão milagroso de desligar gente. Será que estão esgotados?!
Eles, os sábios, embrulharam-se todos em explicações e nada disseram de jeito.
Deve ser segredo! «É segredo dizer qual é a loja?», resolvi perguntar. Viraram costas e foram embora. Descobri! É segredo muito bem guardado!
Porque não me ajudam? Oh sábios, não era mais fácil dizerem logo o segredo; o local, morada, e assim ficavam livres de mim! Oh!
- Segredo! Não se diz a ninguém - sussurrou uma voz tímida ao meu consciente. E continuou - Tens que continuar a procurar. Vais ver, tu consegues, continua a procurar!
- Estou cansada e farta de procurar?!
- Continua, vais encontrar!
Nunca ninguém me ouve. Eu disse que estava cansada! Sacanas. São todos uns sacanas!
Desanimada e frustrada lá continuei a minha pesquisa do que achava não haver. Acho que me andam a enganar!
- Pst! Tu aí de nariz no ar. Oh desanimada! Anda cá! – Esta não é a mesma. Uma voz forte e boçal a falar comigo!
Olhei! Que é isto? O Frank Horroroso! Aqui ao pé de mim!
- Então não é lenda? Só o tinha visto na TV?!
- AHAH! Não minha querida, eu sou o segredo que procuras!
- Então porque não disseram logo?
- Porque é preciso sofrer, procurar, querer, amargar, estupidificar até me encontrar. Uma passagem pelos piores verbos. Anda comigo...
Fiquei na dúvida. Como ia eu com aquele monstro horroroso! Não, não vou!
De repente... larga-me seu monstro, não quero. Deixa-me, solta-me...
Nada adiantou. Ele era mais forte. Um estalo valente e eu fiquei apagada...
Acordei sem saber horas, minutos ou segundos. Apenas eu como tinha vindo ao mundo, amarrada e nua. Apareceu o monstro horroroso. Estou feita!
Olhei em volta a ver se podia gritar. Talvez pedir ajuda a alguém? Como a Internet faz falta! Não! o telemóvel onde está?
Sem solução, tinha que aguentar. Afinal estou aqui amarrada e já todos tinham dito isto.
Então o monstro começou a abrir as várias caixas que tinha. Cada uma delas tinha ferramentas muito pequeninas, outras maiores, fios, chips de várias cores, botões de vários tamanhos, uns com variação de intensidade, outros apenas com duas posições, menos modernos. Aquilo que eu procurava estava ali, à minha frente. Afinal havia botões de desligar.
- Estás com sorte cachopa! – disse o monstro. Eu pensava, deve ser alentejano porque o termo é do Alentejo. Um monstro alentejano – Então vais ter que escolher, moça – Não afinal é do norte – Tens aqui muitos botões que procuravas, rapariga – decididamente é de Lisboa.
Comecei a vaguear os olhos por aquela panóplia de botões. Como é difícil a escolha. Mais valia ter um modelo único, como nas lojas de roupa, modelo único, ninguém pode ser nem mais alto, nem mais baixo, nem mais gordo, nem mais magro, todos iguais com genes diferentes. Só genes?! Génios também!
Lá acabei por escolher um modelito que achava que me ficava bem.
- Agora escolhe os fios. Precisas de...
- Mais uma escolha! Então a electrónica não é por tua conta? – resmunguei.
- Escolhe!
Nova tarefa difícil. São tantos e estão todos emaranhados. Onde está a ponta disto tudo.
Terminei. Escolhi meia dúzia pois já não me lembrava quantos eram. Espero que chegue.
- Agora vamos à parte mais difícil. Local de instalação. Escolhe!
Escolhe outra vez! Tudo, é, escolhe! Porque não está este sábio da electrónica disponível para ajudar nas escolhas. Tenho que ser sempre eu?!
Ok! Começo pela cabeça ou pés? Já sei, tenho que escolher. Então vamos lá ver onde começo. Talvez pelos pés. Dez dedos, mas só preciso de pensar em cinco porque os outros são iguais, afinal nós no exterior somos todos simétricos. Percorri todos os meus dedos mas nenhum era bom para instalar aquele conjunto de fios e o botão. Como ia depois calçar os sapatos?! Era um prejuízo enorme, ter que agora renovar toda a minha sapateira! Que mal ia ficar uma pessoa com o meu tamanho e de pés grandes, todos iam descobrir que não era santa!
Passei às pernas. Meio problema resolvido, eu sou simétrica, esta já tinha descoberto. Como é fácil avançar! Não cheguei a conclusão nenhuma. A fatal depilação. Como ia ser complicado ter que vir aqui ver este monstro cada vez que tivesse que fazer a depilação. Nem pensar, fora de questão. Talvez esta solução seja boa para homens, para mulheres não!
Heheh! Cheguei a uma parte não simétrica. Agora tenho dois problemas. A parte da frente não é igual à parte de trás, e deixei de ser simétrica.
- Frank agora é mais difícil decidir. Deixei de ser simétrica, tanto no interior como no exterior. Ajuda-me!
- Aguenta-te. Desenvencilha-te. Para que serve a cabeça?
- Ainda não cheguei lá. Estou só no corpo.
- Despacha-te que tenho muitos clientes à porta! Não tenho o tempo todo!
Como é simpática esta horrível criatura!
Bom! Se eu dividir por quatro esta parte e começar a incidir a minha atenção por cada uma das partes fica fácil e até já começo a ser simétrica, apesar de cilíndrica. O interior, nem vou pensar nele. Vamos ficar só pelo exterior. Fiquei afinal com 3 partes. Mais fácil. Ora no rabiosque nem pensar em instalar isto. Preciso de me sentar e devia ser desconfortável estar sempre a sentir o meu botão de desligar. Menos uma. O sexo... não me parece! Também não é boa ideia!
O melhor é continuar a subir. Aqui acho que não posso esquecer o interior. Vou ter que pensar nele outra vez, ou seja, ficou outra vez complicado, em vez de diminuir aumentou de novo o meu problema. Não ficou de novo o exterior. Se eu coloco isto no coração ou no estômago tenho que ver este monstro outro vez. Mas era aí que eu mais precisava. Então o mundo não me manda desligar o coração? E os sapos que ficam entalados no estômago?! Aqui é que eu precisava!
- Acho que achei o sitio ideal. No coração. – disse eu. Finalmente tinha descoberto.
- E então queres que fique em ligado ou desligado?
- Então o botão não é para poder ligar e desligar quando eu quiser, e der mais jeito aos outros?
- É! Só que temos que decidir a posição. Quando colocamos no coração o botão passa a ser único. Queres na posição de ligado ou desligado?
Caramba! Este monstro só complica.
Se ficar no desligado não vou aproveitar nada. Acabou aqui. Passarei a ser mostrenga andante. Não me parece! Ligado! Nessa já ele está e complica tudo. Mas todos querem exactamente isso, «não sintas nada,... faz de conta,... deita para trás das costas,... esquece,... pensas demais,...». Oh não!
- Ó Frank podias fazer uma puxada para fora. Tipo extensão. Assim podia estar acessível e ainda tinha a vantagem de poder usar como botão de desligar.
- Não! Já disse. Não se muda as regras. Tens cá uma mania. Escolhe!
Esta vou ter que por de lado. E o estômago vai pelo mesmo caminho. Depressa acabava doente. E a energia onde ia buscar?! Não, esta também não é boa.
E cá fora. Simétrico mas onde? Também não tenho sítio. Lá se iam os prazeres de um abraço ou beijos. Depressa podia desligar quando estivesse na melhor parte. Não pode ser!
Finalmente encontrei. Nos ombros. Boa! Não é aqui que levamos a cruz da vida, nos ombros. É aqui. Achei... Espera! Então e aquele vestido que viste ontem, ombros à mostra. Não faz mal!, agora a moda despe de um lado e põe à mostra o que devia tapar. Basta falar com o estilista que tudo tem solução...! Não ficava muito à mão de qualquer um. Imagina no autocarro e click, desligaram-te sem querer. Não pode ser!
Vamos continuar, continua a subir. Pescoço. Não este é um dos pontos bons. Não que desliga.
Cheguei finalmente à cabeça, coisa inútil hoje em dia. O bom é não ter cabeça, ou melhor seguir a cabeça dos outros, ou ainda seguir a cabeça de quem fala contigo. Andam todos a dar palpites de borla. Todos têm soluções milagrosas, e o «se fosse com eles era...»... Então é aqui mesmo que vai ficar.
- Frank ficou a cabeça de fora. É aqui – disse eu.
- Então não vais mais ao cabeleireiro. Acabou o penteado, lavar o cabelo. Nunca mais podes molhar senão dá curto-circuito. Vais ficar com teias de aranha.
- Não podes arranjar uma touca ou peruca que possa esconder? – disse. Então só tinha mais esta hipótese e este não colaborava comigo? O interior deve ser como o coração, por isso nem vou fazer a sugestão. Essa eu já aprendi. - Ajuda-me Frank. Há sempre solução para tudo. Estou cansada. Dá-me uma ideia!
- Isso não é problema meu. Olha estás a fazer-me perder a paciência. Tenho agora que ver o meu umbigo, coloquei um pircing que está a incomodar. Despacha-te. Também a novela das 3 está a começar e o meu amigo vampiro convidou-me para um churrasco.
Ok! Desisto. Prefiro ficar assim como sou.
- o quê? Então depois de todas as opiniões que dei, depois de me fazeres perder este tempo todo com as tuas indecisões, depois de teres estado a cansar-me de tanto pensares alto, pensas que isto fica assim?! Estás muito enganada! Vais pagar! Afinal deixei de ver a novela da uma, e também estive aqui a aguentar o incómodo do meu percing porque estavas a falar, e eu estive a ouvir!
- Espera, Frank, estás a perceber mal...
- Ainda não entendeste que o segredo é: Faz aos outros o que te fizeram a ti. Parte e procura a primeira oportunidade. Vais ver, vais ficar melhor....És muito mal agradecida... uma ingrata!.... Eu aqui a explicar tudo e tu não entendes nada.
Pegou em mim e deitou-me fora.
Oh! Outra vez neste mundo cão. Tenho os mesmos problemas e não tenho botão de desligar.
Lixada pela falta de um botão..."
Sandra Baptista
abcd2003@tiscali.fr
Estou cansada!
Estou farta!
Parece que o mundo resolveu perseguir-me, palpitar sobre, não me entender. A paciência chegou ao fim, ou será que anda aqui algum astro mau?!
Eh pá! Quem manda neste mundo pode esquecer um pouco de mim?!
Ninguém me ouviu! Andavam todos numa ânsia por desligar-me. Andavam todos com as frases da sabedoria: «Tens que aguentar!». Toda a gente sabe que tem que aguentar, e mesmo que não saiba vai descobrir sozinho, não precisava de ouvir esta!
«O mundo agora é assim!». Gostei da compreensão. E a solução!
Então um dia decidi. Parece que a única burra estúpida sou eu! Afinal todos têm uma teoria para resolver os meus problemas, e principalmente a língua afiada: «era escusado... podia ter feito... o melhor é não pensar muito... pensas demais.... dás demasiada importância a ... esquece isso... não vale a pena...»; bem soluções que todos estamos fartos de ouvir, e quando calha a nossa vez, ficamos verdes, ou azuis, talvez encarnados, de raiva por ter que engolir aquele sapo intragável, que na mão é escorregadio, na garganta áspero, embrulha o estômago de tal forma que ficamos às riscas e depois a digestão dá insónias!
Que pastilha esta!
Então resolvi procurar aquilo que todos tinham mas que eu não conseguia encontrar: o botão de desligar!
O melhor é ir a pé! Chama-se a isto prospecção de mercado. Vá, toca a andar. Nariz para cima, costas direitas e lá vais tu...
Deduzi: se é para desligar, então o que tenho que fazer é procurar uma loja de electrónica ou será de computadores?! Logo se vê, afinal tens tempo!
Entrei numa e o funcionário ficou a pensar que tinha avariado de vez. Esta precisa de Prozac!
- Não temos. - diz ele com o seu ar muito simpático, mas olhar de Coitadinha! - Não era melhor procurar um médico!
- Não eles não entendem! Para este problema ainda não foi encontrado o medicamento certo! – disse eu com o meu ar desiludido e frustrado.
Entrei noutra loja, e passei à seguinte e nada! Percorri todas.
Desisti!
Resolvi perguntar aos sábios como faziam essa coisa de desligar, porque já tinha percorrido todas as lojas de electrónica de Lisboa e ninguém tinha o tal botão milagroso de desligar gente. Será que estão esgotados?!
Eles, os sábios, embrulharam-se todos em explicações e nada disseram de jeito.
Deve ser segredo! «É segredo dizer qual é a loja?», resolvi perguntar. Viraram costas e foram embora. Descobri! É segredo muito bem guardado!
Porque não me ajudam? Oh sábios, não era mais fácil dizerem logo o segredo; o local, morada, e assim ficavam livres de mim! Oh!
- Segredo! Não se diz a ninguém - sussurrou uma voz tímida ao meu consciente. E continuou - Tens que continuar a procurar. Vais ver, tu consegues, continua a procurar!
- Estou cansada e farta de procurar?!
- Continua, vais encontrar!
Nunca ninguém me ouve. Eu disse que estava cansada! Sacanas. São todos uns sacanas!
Desanimada e frustrada lá continuei a minha pesquisa do que achava não haver. Acho que me andam a enganar!
- Pst! Tu aí de nariz no ar. Oh desanimada! Anda cá! – Esta não é a mesma. Uma voz forte e boçal a falar comigo!
Olhei! Que é isto? O Frank Horroroso! Aqui ao pé de mim!
- Então não é lenda? Só o tinha visto na TV?!
- AHAH! Não minha querida, eu sou o segredo que procuras!
- Então porque não disseram logo?
- Porque é preciso sofrer, procurar, querer, amargar, estupidificar até me encontrar. Uma passagem pelos piores verbos. Anda comigo...
Fiquei na dúvida. Como ia eu com aquele monstro horroroso! Não, não vou!
De repente... larga-me seu monstro, não quero. Deixa-me, solta-me...
Nada adiantou. Ele era mais forte. Um estalo valente e eu fiquei apagada...
Acordei sem saber horas, minutos ou segundos. Apenas eu como tinha vindo ao mundo, amarrada e nua. Apareceu o monstro horroroso. Estou feita!
Olhei em volta a ver se podia gritar. Talvez pedir ajuda a alguém? Como a Internet faz falta! Não! o telemóvel onde está?
Sem solução, tinha que aguentar. Afinal estou aqui amarrada e já todos tinham dito isto.
Então o monstro começou a abrir as várias caixas que tinha. Cada uma delas tinha ferramentas muito pequeninas, outras maiores, fios, chips de várias cores, botões de vários tamanhos, uns com variação de intensidade, outros apenas com duas posições, menos modernos. Aquilo que eu procurava estava ali, à minha frente. Afinal havia botões de desligar.
- Estás com sorte cachopa! – disse o monstro. Eu pensava, deve ser alentejano porque o termo é do Alentejo. Um monstro alentejano – Então vais ter que escolher, moça – Não afinal é do norte – Tens aqui muitos botões que procuravas, rapariga – decididamente é de Lisboa.
Comecei a vaguear os olhos por aquela panóplia de botões. Como é difícil a escolha. Mais valia ter um modelo único, como nas lojas de roupa, modelo único, ninguém pode ser nem mais alto, nem mais baixo, nem mais gordo, nem mais magro, todos iguais com genes diferentes. Só genes?! Génios também!
Lá acabei por escolher um modelito que achava que me ficava bem.
- Agora escolhe os fios. Precisas de...
- Mais uma escolha! Então a electrónica não é por tua conta? – resmunguei.
- Escolhe!
Nova tarefa difícil. São tantos e estão todos emaranhados. Onde está a ponta disto tudo.
Terminei. Escolhi meia dúzia pois já não me lembrava quantos eram. Espero que chegue.
- Agora vamos à parte mais difícil. Local de instalação. Escolhe!
Escolhe outra vez! Tudo, é, escolhe! Porque não está este sábio da electrónica disponível para ajudar nas escolhas. Tenho que ser sempre eu?!
Ok! Começo pela cabeça ou pés? Já sei, tenho que escolher. Então vamos lá ver onde começo. Talvez pelos pés. Dez dedos, mas só preciso de pensar em cinco porque os outros são iguais, afinal nós no exterior somos todos simétricos. Percorri todos os meus dedos mas nenhum era bom para instalar aquele conjunto de fios e o botão. Como ia depois calçar os sapatos?! Era um prejuízo enorme, ter que agora renovar toda a minha sapateira! Que mal ia ficar uma pessoa com o meu tamanho e de pés grandes, todos iam descobrir que não era santa!
Passei às pernas. Meio problema resolvido, eu sou simétrica, esta já tinha descoberto. Como é fácil avançar! Não cheguei a conclusão nenhuma. A fatal depilação. Como ia ser complicado ter que vir aqui ver este monstro cada vez que tivesse que fazer a depilação. Nem pensar, fora de questão. Talvez esta solução seja boa para homens, para mulheres não!
Heheh! Cheguei a uma parte não simétrica. Agora tenho dois problemas. A parte da frente não é igual à parte de trás, e deixei de ser simétrica.
- Frank agora é mais difícil decidir. Deixei de ser simétrica, tanto no interior como no exterior. Ajuda-me!
- Aguenta-te. Desenvencilha-te. Para que serve a cabeça?
- Ainda não cheguei lá. Estou só no corpo.
- Despacha-te que tenho muitos clientes à porta! Não tenho o tempo todo!
Como é simpática esta horrível criatura!
Bom! Se eu dividir por quatro esta parte e começar a incidir a minha atenção por cada uma das partes fica fácil e até já começo a ser simétrica, apesar de cilíndrica. O interior, nem vou pensar nele. Vamos ficar só pelo exterior. Fiquei afinal com 3 partes. Mais fácil. Ora no rabiosque nem pensar em instalar isto. Preciso de me sentar e devia ser desconfortável estar sempre a sentir o meu botão de desligar. Menos uma. O sexo... não me parece! Também não é boa ideia!
O melhor é continuar a subir. Aqui acho que não posso esquecer o interior. Vou ter que pensar nele outra vez, ou seja, ficou outra vez complicado, em vez de diminuir aumentou de novo o meu problema. Não ficou de novo o exterior. Se eu coloco isto no coração ou no estômago tenho que ver este monstro outro vez. Mas era aí que eu mais precisava. Então o mundo não me manda desligar o coração? E os sapos que ficam entalados no estômago?! Aqui é que eu precisava!
- Acho que achei o sitio ideal. No coração. – disse eu. Finalmente tinha descoberto.
- E então queres que fique em ligado ou desligado?
- Então o botão não é para poder ligar e desligar quando eu quiser, e der mais jeito aos outros?
- É! Só que temos que decidir a posição. Quando colocamos no coração o botão passa a ser único. Queres na posição de ligado ou desligado?
Caramba! Este monstro só complica.
Se ficar no desligado não vou aproveitar nada. Acabou aqui. Passarei a ser mostrenga andante. Não me parece! Ligado! Nessa já ele está e complica tudo. Mas todos querem exactamente isso, «não sintas nada,... faz de conta,... deita para trás das costas,... esquece,... pensas demais,...». Oh não!
- Ó Frank podias fazer uma puxada para fora. Tipo extensão. Assim podia estar acessível e ainda tinha a vantagem de poder usar como botão de desligar.
- Não! Já disse. Não se muda as regras. Tens cá uma mania. Escolhe!
Esta vou ter que por de lado. E o estômago vai pelo mesmo caminho. Depressa acabava doente. E a energia onde ia buscar?! Não, esta também não é boa.
E cá fora. Simétrico mas onde? Também não tenho sítio. Lá se iam os prazeres de um abraço ou beijos. Depressa podia desligar quando estivesse na melhor parte. Não pode ser!
Finalmente encontrei. Nos ombros. Boa! Não é aqui que levamos a cruz da vida, nos ombros. É aqui. Achei... Espera! Então e aquele vestido que viste ontem, ombros à mostra. Não faz mal!, agora a moda despe de um lado e põe à mostra o que devia tapar. Basta falar com o estilista que tudo tem solução...! Não ficava muito à mão de qualquer um. Imagina no autocarro e click, desligaram-te sem querer. Não pode ser!
Vamos continuar, continua a subir. Pescoço. Não este é um dos pontos bons. Não que desliga.
Cheguei finalmente à cabeça, coisa inútil hoje em dia. O bom é não ter cabeça, ou melhor seguir a cabeça dos outros, ou ainda seguir a cabeça de quem fala contigo. Andam todos a dar palpites de borla. Todos têm soluções milagrosas, e o «se fosse com eles era...»... Então é aqui mesmo que vai ficar.
- Frank ficou a cabeça de fora. É aqui – disse eu.
- Então não vais mais ao cabeleireiro. Acabou o penteado, lavar o cabelo. Nunca mais podes molhar senão dá curto-circuito. Vais ficar com teias de aranha.
- Não podes arranjar uma touca ou peruca que possa esconder? – disse. Então só tinha mais esta hipótese e este não colaborava comigo? O interior deve ser como o coração, por isso nem vou fazer a sugestão. Essa eu já aprendi. - Ajuda-me Frank. Há sempre solução para tudo. Estou cansada. Dá-me uma ideia!
- Isso não é problema meu. Olha estás a fazer-me perder a paciência. Tenho agora que ver o meu umbigo, coloquei um pircing que está a incomodar. Despacha-te. Também a novela das 3 está a começar e o meu amigo vampiro convidou-me para um churrasco.
Ok! Desisto. Prefiro ficar assim como sou.
- o quê? Então depois de todas as opiniões que dei, depois de me fazeres perder este tempo todo com as tuas indecisões, depois de teres estado a cansar-me de tanto pensares alto, pensas que isto fica assim?! Estás muito enganada! Vais pagar! Afinal deixei de ver a novela da uma, e também estive aqui a aguentar o incómodo do meu percing porque estavas a falar, e eu estive a ouvir!
- Espera, Frank, estás a perceber mal...
- Ainda não entendeste que o segredo é: Faz aos outros o que te fizeram a ti. Parte e procura a primeira oportunidade. Vais ver, vais ficar melhor....És muito mal agradecida... uma ingrata!.... Eu aqui a explicar tudo e tu não entendes nada.
Pegou em mim e deitou-me fora.
Oh! Outra vez neste mundo cão. Tenho os mesmos problemas e não tenho botão de desligar.
Lixada pela falta de um botão..."
Sandra Baptista
abcd2003@tiscali.fr